2016/05/31

UMA GRANDE CALDEIRADA

A soberania de um país é comparável ao papel do homem no casamento. Há igualdade de direitos mas as directrizes são sempre impostas pela outra parte. Nada a fazer!

Portugal sofreu uma limitação de quota disponível, para a pesca da sardinha, durante os últimos meses. Durante este tempo poucos se importaram com os pescadores. Nem como conseguiram sobreviver ou garantir o seu fraco rendimento apesar das contas continuarem a chegar todos os meses! A restrição terminou. E, entretanto, algo mudou nas mentalidades politiqueiras Tugas…

O canal de televisão “Sic” assegurou a cobertura mediática de um gesto tantas vezes repetido e sem tanta cerimónia: a pesca da sardinha. Foi possível acompanhar, a partir de Matosinhos, o regresso dos pescadores à faina. Contudo, analisando as imagens divulgadas, fiquei convencido que, no local, estiveram mais políticos do que pescadores. Com aspecto cansado, pois esta malta trabalha em horários nada saudáveis.

A actual Ministra do Mar, o adjunto do secretário de Estado das Pescas, o Presidente da Câmara Municipal, a Presidente da Assembleia Municipal e, com certeza, outras individualidades importantes que fizeram questão de marcar presença e sorrir (ensonados) para as câmaras de vídeo. E pescadores? Filmados ao longe, dentro dos barcos, a tocar as sirenes.

A reportagem seguinte abordou o mesmo tema, em Portimão. No entanto, por lá, nenhum político deu à costa…
 

2016/05/27

A LENDA DO ABUTRE DA MAIA

Durante vários anos – fruto da vontade política dos sucessivos governos – a linha de metro termina na cidade da Maia, junto ao Ismai. Outrora, o comboio serviu as pessoas que se deslocavam até à Trofa. Os locais nunca se conformaram com esta decisão e reclamam, constantemente, pela chegada deste transporte público. Um anúncio governamental, com o intuito de prolongar a linha, reacendeu os ânimos e expectativas. Os mais saudosistas quiseram visitar o antigo traçado da linha de comboio. Actualmente coberto com vegetação bastante densa e algumas árvores. Contudo, o acesso está vedado e monitorizado pelas forças de vigilância privada. Mas, mesmo assim... 

 

Para afastar os curiosos – que não aceitam o não como resposta – um cidadão local (enquanto aguardava a chegada do metro) explicou a um grupo de pessoas que tamanha segurança estava relacionada com o abutre do Ismai! Uma ave enorme que surge por entre a vegetação para reclamar o sossego da floresta e que detesta forasteiros. Inclusive, condutores do metro quando param as composições no final do serviço. Alguns recusam-se! A linha termina na pequena floresta, porque ninguém ousa enfrentar a fera! Incrédulos, não quiseram arriscar. Dias depois, um jovem foi interceptado pelo vigilante. Estava vestido com um fato de plástico, máscara e chapéu. Tinha um pau na mão. Bastante alterado, gritava que tinha de chegar à floresta para matar o abutre, destruir a lenda para que o metro chegue à Trofa! Tinha de ser! À paulada! Agarrem-me que eu vou-me a ele! Ah, maldito abutre! Um produto da imaginação aventureira humana que se espalhou e que serviu para motivar. Porque é fundamental ter algo em que se acredita. Mesmo que seja uma brincadeira. Ou não.

in "As Crónicas Tugas, tem de ser" (Chiado Editora, 2016)

2016/05/24

VELHO E CANSADO

Esta é a primeira crónica que escrevo após a celebração de mais um aniversário. Não se preocupem se vos escapou a data. Sinceramente, nesta fase avançada da vida, até prefiro não receber os parabéns. Mais um dia, sem qualquer grande entusiasmo, para cumprir calendário. E, se pudesse, ficava sempre com a mesma idade! Pronto. Aceito que estou a ser melodramático e exagerado, pois são apenas 36 primaveras. Mas custam! A minha grande ambição foi conseguir atingir a maior idade. Obter a carta de condução e o cartão de eleitor - agora já não sei para que serve. Depois a compra do primeiro carro: grande, vistoso, imponente e ruidoso. Sem ligar nenhum ao valor das prestações bancárias e demais despesas. Afinal, os pais servem para isso! Olhando para trás, já tenho o dobro da idade e, entre retomas e aquisições, já vou na quarta viatura...

 

Excedi os objectivos e os sucessivos orçamentos familiares. Encaro a vida com outros olhos. Sinto que todos são mais novos. Aliás, já tenho possibilidade de integrar o plantel de uma equipa de futebol de veteranos! Mas, com o meu talento apurado e dois pés esquerdos, duvido que o consiga. É necessária grande aptidão física. E quando penso nisso, tenho a certeza que nem sequer um cão raivoso me faria correr grandes distâncias. Será uma grande perda para a modalidade! Mas isto não tem a ver com a velhice! Eu sei. Tudo o que descrevi chama-se “preguicite aguda”! E têm razão, caros leitores. Vou deixar estas parvoíces e retomar a escrita. Há mais crónicas humorísticas, bizarras e verdadeiras para partilhar. É esse o meu compromisso e aproveito para deixar o meu sincero agradecimento pelo vosso interesse, apoio e amizade!

in "As Crónicas Tugas, tem de ser" (Chiado Editora, 2016)

O SONHO DO TEU FUTURO

Um dia depois e ainda sinto o nervoso miudinho da mais recente data que ficará gravada, para sempre, na cronologia da nossa gloriosa história. 10 de Novembro. O dia em que recuperamos a nossa liberdade perante a austeridade, crise, fascismo e outras coisas que queiram ver aqui escritas. E eu, ainda ganhei uma conta extra, do telemóvel, pois ultrapassei o plafond de Internet móvel para conseguir acompanhar novas de Lisboa.

Na Assembleia teve lugar um debate, que durou dois dias, entre os dois pólos distintos. Os que queriam governar e os que queriam começar a governar. Confusos?! Não. O acordo inédito e histórico foi assinado e os partidos da oposição (a força de esquerda) apenas aguardavam pelo final do debate para entregar a moção de rejeição. Documento responsável pela queda do XX governo. O mais curto da história com 11 dias de duração. E mesmo assim deu para ver alguns aselhas e suas tristes figuras.

O povo saiu à rua! Algumas camionetas de excursão foram desviadas, da sua rota, para conseguir levar reformados até à capital. Todos a caminho das manifestações! Sim. Duas! Separadas por escassos metros e por alguns agentes de autoridade – assustados com o cheiro a naftalina – receando que os ânimos se exaltassem e tivesse lugar uma luta entre bengalas e andarilhos. Uns a favor da mudança política e os outros a favor do actual governo e austeridade. Já se gritava “liberdade”, “vitória” e “o governo caiu” duas horas antes da votação oficial. O entusiasmo tem destas coisas… A Grândola Morena também foi cantada.

E assim foi o remake do 25 de Abril. Sem confrontos. Sem violência. Sem chaimites. Sem cravos. Mas, tendo em conta as reportagens televisivas, a cabidela e o vinho tinto ficarão como símbolo deste dia… Mas a história não termina aqui! Tem a palavra, Cavaco Silva. É aguardar. 
 

2016/05/17

SOLUÇÕES DRÁSTICAS

Ao longe, o toque desenfreado das sirenes captaram a atenção de todos os transeuntes que circulavam na avenida. Com preocupação, todos questionaram o motivo de tanto alarido e sua gravidade. E eis que surge, no horizonte, uma viatura reboque ao serviço da polícia municipal e uma viatura de socorro da corporação de bombeiros local. Rapidamente, uma pequena árvore, plantada no meio de um passeio público, transformou-se no centro das atenções. Não se vislumbrou qualquer indício do motivo da urgência! Tudo em redor estava normal. Motivo (mais que suficiente) para se formar um pequeno ajuntamento de observadores sazonais para avaliar o panorama. Entretanto, depois de colocar a escada, um bombeiro, desapareceu por entre as folhas...

Para combater a falta de informação, alguns dos presentes desenvolvem estranhas teorias. «Vão cortar os galhos». «É um ninho de vespas asiáticas». Um grito de comando, vindo do interior da árvore, interrompeu a formulação de teorias. Um segundo bombeiro começou a retirar a mangueira da viatura. Com o jacto de água, na pressão máxima – visível pela quantidade de folhas e ramos que arrancou – apontou para o centro da árvore. Fez-se silêncio. Perante o olhar curioso e apreensivo, de todos os que assistiram a esta manobra, surge em pleno estado de terror… um pobre gato! E depois de sentir as suas patas em solo firme iniciou uma fuga, em linha recta, com tamanha velocidade que julgo ainda não ter parado de correr.